terça-feira, 25 de novembro de 2008

SEU LUNGA - O CABRA MAIS IGNORANTE DO BRASIL


Uma lenda viva, literalmente. Seu Lunga para os mais desavisados é o cabra mais ignorante do mundo. Alguns até dizem que ele está prestes a entrar na seleta lista do Guiness Book – O famoso livro dos recordes - em função disso. Sua fama vai de Norte a Sul do Nordeste e já está tomando conta do Brasil.
Muitos acham que Seu Lunga não existe, que é apenas um personagem do folclore Nordestino, mas ele existe sim. É de carne, osso e "ignorância". Mora em Juazeiro do Norte-CE, na região do Crato (local que reúne cidades como Juazeiro, Barbalha e a própria Crato). Seu nome de batismo é Joaquim dos Santos Rodrigues, tem 81 anos e possui uma espécie de Sucata na Rua Santa Luzia, próxima a Rua São Paulo. Quem duvidar, basta conferir.
Seu Lunga é figura clássica em causos ou piadas aqui no Nordeste. Tão famosas quando piadas de papagaio, bêbado, rapariga, corno ou viado, são as histórias que fazem alusão a falta de paciência dele. Devido a toda essa fama, muita gente que vai a Juazeiro, não que vê o Padre Cícero não, prefere conhecer Seu Lunga.



Joaquim dos Santos Rodrigues: o homem seu Lunga
Seu Lunga é apenas o apelido de Joaquim dos Santos Rodrigues. As piadas sobre ele escondem atrás da personagem o homem real, nascido em Caririaçu, fronteira Norte de Juazeiro, em 18 de Agosto de 1927. Viveu a infância com os pais e mais sete irmãos, "no meio dos matos,"afastado da cidade. O apelido lhe acompanha desde esta época, quando uma vizinha de sua família, que ele só identifica como preta velha, começou a lhe chamar de Calunga, que virou Lunga e pegou.
Começou a trabalhar na roça aos oito anos de idade, e admira a criação rígida que teve de seu pai, o que marca um aspecto psicossocial do homem Lunga. Sobre a educação recebida, Lunga responde: "Uma educação desses pais de família sérios, homem de responsabilidade, homem de caráter, homem de palavra, homem de respeito." Lunga deixa sua postura um tanto desinteressada da conversa, para deixar transparecer sua admiração pelo pai.
Da infância traz poucas lembranças, como as brincadeiras com os colegas, que eram seus próprios irmãos. Entre os irmãos dominava a determinação do pai de que os mais novos deveriam obedecer aos mais velhos. Há também as lembranças das poucas idas à cidade, acompanhando o pai que ia vender ou comprar algo. Foi assim até aos 16 anos, quando se mudou para o Juazeiro.
mudança para o Juazeiro se deu depois que Lunga caiu em uma cacimba e adoeceu, impedindo-o de trabalhar na roça com o pai. Lá ele aprendeu a arte de ourives, e viveu disso por dois anos. Foi nesse período que seu Lunga aprendeu a negociar no Mercado Público da cidade, passando depois a trabalhar no comércio com sua loja de sucata.A determinação de seu Lunga que o fez ir para a cidade morar longe da família e conseguir sobreviver fazendo o que nunca tinha feito antes também se mostrou quando pediu a prima em casamento.
Sem nunca terem namorado, Lunga deu a ela três dias para pensar se queria ou não casar-se com ele. Terminado o prazo, ela aceitou o pedido, e só não se casaram no dia seguinte, porque o pai da moça não deixou. O namoro então durou uns dois ou três meses.
Casado desde 1951, hoje Lunga é pai de treze filhos, mas se ressente de não ter podido lhes dar uma educação mais rígida, pois sua esposa "é contra se castigar um filho." Apesar disso, ele se orgulha de todos eles, com exceção de um, terem estudado e se formado em alguma profissão (nenhum com nível superior, entretanto), ao contrário dele mesmo, que foi às aulas por apenas dois meses.
O pai Lunga reflete a rigidez do homem que deu origem a toda a construção da personagem pouco flexível, mas ao mesmo tempo deixa transparecer o orgulho comum a todos os pais: oferecer boa educação aos filhos. É interessante também notar como a realidade interiorana de Lunga influencia em sua avaliação da educação de seus filhos. Ao dizer que quase todos os filhos eram formados, ele disse que nenhum, entretanto, tinha "formatura alta," referindo-se à formação de nível superior.
Ora, em sua vivência, a formação acadêmica é um contexto distante, dispensável para seu estilo de vida. A pouca instrução de Lunga, por outro lado, não o impede de discorrer sobre assuntos como política, cultura, religião, nem o impediu também de candidatar-se a vereador da cidade de Juazeiro em 1988, eleição que não ganhou porque, segundo ele, teve seus votos roubados.

Veja causos e piadas sobre seu Lunga, clique no link
http://culturanordestina.blogspot.com/2007/09/piadas-de-causos-de-seu-lunga.html

HISTÓRIA DO CORDEL


A Origem nas Feiras Medievais

Nossa viagem em busca das origens do cordel começa na Europa, na Idade Média, num tempo em que não existia televisão, cinema e teatro para divertir o povo. A imprensa ainda não tinha sido inventada e pouquíssima gente sabia ler e escrever. Os livros eram raríssimos e caros, pois tinham de ser copiados a mão, um a um. Então, como as pessoas faziam para conhecer novas história.

Pois bem, mesmo nos pequenos vilarejos existia um dia da semana que era especial: o dia da feira. Nessas ocasiões, um grande número de pessoas se dirigia à cidade, e ali os camponeses vendiam seus produtos, os comerciantes ofereciam suas mercadorias e artistas se apresentavam para a multidão.

Um tipo de artista muito querido por todos era o trovador ou menestrel. Os trovadores paravam num canto da praça e, acompanhados por um alaúde (um parente antigo dos violões e violas que conhecemos hoje), começavam a contar histórias de todo tipo: de aventuras, romance de paixões e lendas de reis valentes, como o Rei Carlos Magno e seus doze cavaleiros.

Para guardar tantas histórias na cabeça, os trovadores passaram a contar suas histórias em versos. Dessa forma as rimas iam ajudando o artista a se lembrar dos versos seguintes, até chegar o fim da história.

Ao final da apresentação, o povo jogava moeda dentro do estojo do alaúde. O trovador, satisfeito, agradecia e partia em direção a próxima feira.


Surgem os primeiros folhetos

Com a invenção da imprensa pelo alemão Johannes Gutenberg, por volta de 1440, os livros impressos ficaram com o custo mais acessível, e mais pessoas vieram a se interessar pela palavra escrita. Foi quando os trovadores perceberam a oportunidade de aumentar seus rendimentos e passaram a oferecer também o texto impresso de seus poemas, ao final de suas apresentações.

No início, esses versos não tinham ainda o formato de livrinhos encadernados e se constituíam de folhas soltas. Por isso, em Portugal ganharam o nome de folhas volantes. Na Espanha ficaram conhecidas como pliegos sueltos e na França como lttérature dcolportage.


A tradição chega ao Brasil

Junto com os colonizadores portugueses, a tradição dos trovadores e folhetos chegou ao Brasil e aos poucos, começou a se difundir pelo interior do país. E foi no sertão do Nordeste que acabou ganhando mais força e aceitação. Apesar de está presente em nosso país desde o século XVI, somente no final do século IXX é que a literatura de cordel começou a adquirir a forma que conhecemos até hoje: livrinhos - também chamados de folhetos - encadernados e histórias contadas em estrofes de seis versos cada, a sextilhas.

E nessa mesma época surgiram os primeiros grandes mestres da literatura de cordel, como Ugolino Nunes da Costa, Germano da Lagoa e o mais conhecido de todos, Leandro Gomes de Barros (1868-1918).


De onde vem o nome cordel

Os vendedores de folhetos trabalhavam de feira em feira, viajando a cada dia para um lugarejo diferente. Eles tiveram de inventar uma maneira prática e barata de expor seus livros aos clientes e leitores.

Numa livraria tradicional, os livros são colocados em estantes e prateleiras. como não podem carregar esses móveis pesados com eles, os vendedores de folhetos costumam trazer em suas malas, junto com os livros, vários rolos de barbante. Ao chegar a praça do mercado, eles esticam essas cordinhas (ou cordéis) entre dois postes ou duas árvores e nelas penduram os livrinhos abertos na página central. Foi daí que surgiu o termo literatura de cordel, que conhecemos até hoje. Nos dias de vento, os vendedores prendem os livrinhos com regadores de roupa e pronto: está montada a livraria!

DI-VERSOS RAPIDINHOS


Se eu lhe disser...

Se eu lhe disser que não sei
Se disse o que não sabia
saberia se soubesse
saber bem o que queria
e sem querer eu não sei
querendo não saberei
só se eu disser em poesia

poeta Marco di aurélio da cidade de Cabrobó-pe

POESIAS E CORDEIS

Caboclo Roceiro
Patativa do assaré,
do LP "A Terra é Naturá"


Caboclo Roceiro, das plaga do Norte
Que vive sem sorte, sem terra e sem lar,
A tua desdita é tristonho que canto,
Se escuto o meu pranto me ponho a chorar

Ninguém te oferece um feliz lenitivo
És rude e cativo, não tens liberdade.
A roça é teu mundo e também tua escola.
Teu braço é a mola que move a cidade

De noite tu vives na tua palhoça
De dia na roça de enxada na mão
Julgando que Deus é um pai vingativo,
Não vês o motivo da tua opressão

Tu pensas, amigo, que a vida que levas
De dores e trevas debaixo da cruz
E as crides constantes, quais sinas e espadas
São penas mandadas por nosso Jesus

Tu és nesta vida o fiel penitente
Um pobre inocente no banco do réu.
Caboclo não guarda contigo esta crença
A tua sentença não parte do céu.

O mestre divino que é sábio profundo
Não faz neste mundo teu fardo infeliz
As tuas desgraças com tua desordem
Não nascem das ordens do eterno juiz

A lua se apaga sem ter empecilho,
O sol do seu brilho jamais te negou
Porém os ingratos, com ódio e com guerra,
Tomaram-te a terra que Deus te entregou

De noite tu vives na tua palhoça
De dia na roça , de enxada na mão
Caboclo roceiro, sem lar , sem abrigo,
Tu és meu amigo, tu és meu irmão.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O ARTISTA - AMAZAN



A REVOLTA DAS JUMENTAS


Quem primeiro inventou greve
Aqui em cima do chão
Foi um lote de jumentas
Até com certa razão
É que Deus tava criando
Seus animais e soltando
Uns com urro, outros com berro
E por muito ter trabalhado
Sentiu-se um pouco cansado
Porque ninguém é de ferro.
Deus estava terminando
De inventar o jumento
Mas resolveu descansar
Determinado momento
Chamou um anjo importante
Que era seu ajudante
E amigo particular
E lhe disse com capricho
Termine aqui esse bicho
Que eu vou ali descansar.
E quando Deus retornou
Do seu descanso sagrado
Deu de cara com o jumento
Que já tava terminado
Mas notou logo um defeito
E disse assim desse jeito:
"Rapaz num tem jeito não,
só dá tempo eu me ausentar,
pro negócio desandar
no setor da criação."
É que o seu ajudante
Concluindo o animal
Deixou aquele negócio
Meio desproporcional
Metro e "mei" de comprimento
Maior do que o jumento
Chega passava da venta
Deus disse: "Num presta não,
que não vai ter posição
dele subir na jumenta."
O anjo disse: "Eu ajeito,
Comigo não tem fracasso,
É só pegar uma faca
E tirar aqui um pedaço.
"As jumentas escutando,
Foram logo se juntando
E num desejo comum,
Disseram logo em seguida:
"Vê se arruma outra saída,
cortar? De jeito nenhum."
E fizeram uma assembléia
Colocaram em votação
Ganhou por unanimidade
A frase do "corta não"
Com a confusão criada
Deus viu que da enrascada
O anjo não sairia,
Aí entrou em ação
Pra mostrar a dimensão
Da sua sabedoria.
A marreta de dois quilos
Pediu para alguém trazer
E disse: "Segura o jegue,
que a gente vai rebater.
"Aí baixou a pancada
Dava cada marretada
Chega esquentava a marreta
E o jegue até hoje em dia
Possui a mercadoria,
Da forma de uma corneta.




Amazan nasceu em Campina Grande, no dia 05 de Outubro de 1963 e foi criado em Jardim do Seridó, interior do Rio Grande do Norte, onde desde criança já apreciava a poesia e a boa música nordestina. Ainda no início da adolescência dava os primeiros acordes na sanfona. Em Jardim do Seridó viveu até os 19 anos, quando voltou para Campina Grande. Na Rainha da Borborema, por volta de 1984, conheceu o grupo de cultura nativa Tropeiros da Borborema e, a convite de Gerson Brito, seu Diretor, passou a ser "tocador oficiá dos tropêro". Como membro dos Tropeiros, Amazan teve oportunidade de mostrar a sua arte para vários estados brasileiros e até para a Europa, sendo o grupo uma vitrine para o seu trabalho e para uma mudança profunda na sua visão do mundo. O seu fascínio pela música determinou definitivamente os caminhos pelos quais iria percorrer, e junto com dois outros integrantes formou "os três do forró" e gravou o seu primeiro compacto; Algum tempo depois este grupo se desfez e um novo trio foi criado, o "festejo nordestino", e mais um compacto gravado. Era o início de uma definição profissional.


A poesia chegou primeiro na vida de Amazan e por volta dos doze anos escreveu o primeiro de uma série de cordéis. Escreveu e editou dois livros. Palavra De Nordestino e Nordeste Em Carne e Osso. O terceiro livro, HumoRimado está em fase de digitação. As suas composições atestam a sua maturidade e autenticidade de quem cresceu em contato com a típica condição nordestina, ouvindo cantigas que carregavam em suas letras a realidade do sertão e o retrato genuíno da saga de pessoas que conhecia e eram personagens dessas histórias. Amante do forró, enriquecido pelas raízes culturais que lhe deram suporte para buscar estabilidade, autenticidade, mas também pela responsabilidade de levar ao seu público uma cultura enraizada nos pilares nordestinos, com amor e respeito ao gênero musical sem recorrer a apelos agressivos...........E nesse caminho, Amazan canta e conta as paixões, o pensamento e a cultura de um povo, sendo a música e a poesia a meta de realizar o desejo de falar a língua emocional do mundo e um veículo mágico para transformar dificuldades e tristezas, e exaltar a alegria do canto e da dança.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

"O PÁSSARO REPENTISTA"

Patativa do Assaré e seus
gorjeios poéticos




As penas plúmbeas, as asas e cauda pretas da patativa, pássaro de canto enternecedor que habita as caatingas e matas do Nordeste brasileiro, batizaram poeta Antônio Gonçalves da Silva, conhecido em todo o Brasil como Patativa do Assaré, referência ao município que nasceu. Analfabeto "sem saber as letra onde mora ", como diz num de seus poemas, sua projeção em todo o Brasil se iniciou na década de 50, a partir da regravação de "Triste Partida", toada de retirante gravada por Luiz Gonzaga.
Filho do agricultor Pedro Gonçalves da Silva e de Maria Pereira da Silva, Patativa do Assaré veio ao mundo no dia 9 de março de 1909. Criado num ambiente de roça, na Serra de Santana, próximo a Assaré , seu pai morrera quando tinha apenas oito anos legando aos seus filhos Antônio, José, Pedro, Joaquim, e Maria o ofício da enxada, "arrastar cobra pros pés" , como se diz no sertão.
A sua vocação de poeta, cantador da existência e cronista das mazelas do mundo despertou cedo, aos cinco anos já exercitava seu versejar. A mesma infância que lhe testemunhou os primeiros versos presenciaria a perda da visão direita, em decorrência de uma doença, segundo ele, chamada "mal d'olhos".
Sua verte poética serviu vassala a denunciar injustiças sociais, propagando sempre a consciência e a perseverança do povo nordestino que sobrevive e dá sinais de bravura ao resistir ao condições climáticas e políticas desfavoráveis. A esse fato se refere a estrofe da música Cabra da Peste:
"Eu sou de uma terra que o povo paddece
Mas não esmorece e procura vencer
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba do sofrê
Não nego meu sangue, não nego meu nome.
Olho para a fome , pergunto: que há ?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará."
Embora tivesse facilidade para fazer versos desde menino, a Patativa do município de Assaré, no Vale do Cariri, nunca quis ganhar a vida em cima do seu dom de poeta. Mesmo tendo feito shows pelo Sul do país, quando foi mostrado ao grande público por Fagner em finais da década de 70, até hoje se considera o mesmo camponês humilde e mora no mesmo torrão natal onde nasceu, no seu pedaço de terra na Serra de Santana.
Do Vale do Cariri, que com-preende o Sul do Ceará e parte Oeste da Paraíba, muitas famílias migraram para outras regiões do Brasil. A própria família Gonçalves , da qual faz parte o poeta, se largou do Crato , de Assaré e circunvizinhan-ças para o Sul da Bahia, em busca do dinheiro fácil do cacau, nas décadas de 20 e 30.Seus livros foram publicados ocasionalmente por pesquisadores e músicos amigos e, parceria com pequenos selos tipográficos e hoje são relíquias para os colecionadores da literatura nordestina.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

POESIAS DA NOSSA TERRA



REENCONTRO MATERNO



Minha mãe fez despedida
Quando ainda era criança,
Acabou-se a esperança
Que eu tinha pra minha vida.
Mas pra minha mãe querida,
Eu prometi pela luz
Que Deus-Pai é quem conduz...
E ao chegar a morte bela,
Vou ficar bem junto dela
Na morada de Jesus.

E eu quando lhe encontrar,
Vou dizer coisas que um dia
Esta minha poesia
Não pôde bem expressar.
Então Deus vai me falar:
“Meu filho, me dê a cruz...
Teu sentimento traduz
O amor que tens por ela,
Podes ir pra junto dela
À morada de Jesus”.

E neste encontro de brilho
Vou ver minha mãe sorrindo...
Vindo a mim e me pedindo:
“Me dê um abraço, meu filho.
Vamos seguir este trilho,
Tirar do rosto o ‘capuz’,
E não agir contra a luz
Da divindade singela.
Eis a Casa santa e bela...
A Morada de Jesus”.

Então direi: “Pai amado,
Eu lhe dou muito obrigado...
Já completei minha sina.
Não agüentei a saudade...
Por isso que por vontade
Vou ter mais felicidade
Com a minha mãe divina”

Poeta Felipe Júnior








O MELHOR DO CORDEL


VERDADE SOBRE A MORTE DAS VITIMAS DO ABORTO


--- Walter Medeiros



No pé da Serra da Onça -
Alto sertão de Alagoas -
O povo gosta de loas
Mas tem a maior responsa:
Criança, jovem e coroas
Discutem as coisas boas
E combatem gente sonsa.

Pois numa noite bem mansa,
A lua branqueando o Céu,
Foi de tirar o chapéu
E não perder na lembrança
O filho de Dona Bel
Enfrentou seu Miruel
Num assunto que não cansa.

Seu Miruel é ateu,
Do bem ele quer distância;
Homem cheio de ganância,
Rouba até parente seu.
Uma triste discrepância
Que deixa muitos na ânsia
De vê-lo comendo breu.

Além de tudo é perverso,
Sem ética nem moral;
É mesmo gente do mal,
Mas está no Universo;
E seu maior ideal
É ver uma lei fatal
Nascer num novo processo.

Ele defende o aborto,
É homem muito falante,
Tem um tom repugnante
Mas não quero lhe ver morto;
Quero que ele se espante
Com a verdade de Dante
Que é matar um zigoto.

Ao vê-lo todo exaltado,
O filho de dona Bel
Que nunca foi bacharel
Nem tinha sido testado,
Olhou a barra do Céu
E até quem tava ao léu
Foi ouvir o seu recado:

- Neste dia iluminado
Da minha amada vida,
Esta pendenga sofrida,
Cheia de arrazoado,
Ganha a maior guarida
Para ser bem referida
Neste momento rimado.

- Pois neste mundo malvado,
De tanto conceito torto,
Vou também falar do aborto,
Que está sendo analisado
Da roça ao cais do porto,
Temos muito bebê morto
E outros sendo assassinados.

- Alguém terá desconforto,
Mas quero falar da vida
Que é sempre concebida
Como semente no horto,
Quando a mãe engravida
No instante dá guarida
Ao pequenino zigoto.

- Não sei por quê se duvida
Daquele exato momento
Onde surge o rebento
E a pessoa é concebida;
Nem mesmo o mais avarento
Teria outro pensamento
Sobre aquela nova vida.

Ao ver o homem rimando
O povo ficou feliz,
Pois um simples aprendiz
Estava ali ensinando
O que a gente boa diz
No templo e na matriz
E ele foi assimilando.

É mesmo sinal dos tempos
Tamanha aberração,
Pessoas sem gratidão
Que um dia foram rebentos,
Mas defendem punição
Pra quem não tem condição
De defender um intento.

Depois da vida formada
Seus direitos se garantem;
Nem mesmo o mais falante
Consegue mudar mais nada,
Pois se mudar é mandante
De um crime horripilante
Contra a vida iniciada.

Não pode ter exceção,
Nem ser regulamentada,
Se não pode fazer nada
Durante a operação
A mãe pode ser poupada
Mas a criança gerada
Também precisa atenção.

- O que ocorre, entretanto,
É que a coisa é diferente,
Pois tem muito delinqüente
Deixando gente em pranto,
Fazendo aborto indecente
Traumatiza nossa gente
Ou manda pro campo santo.

O filho de Dona Bel
Que tem pequeno apelido
É conhecido por Dido
Falou até de bordel
Foi bastante aplaudido
E se já era querido
Virou rival de Miruel.

- Aborto é incompetência
De pretensos governantes
Que podem ser bem falantes
Mas inventam na ciência
Motivos extravagantes
Pra matar feito marchantes
Muitos fetos, sem clemência.

O filho que foi gerado
Precisa mesmo nascer
Seu direito de viver
Tem de ser assegurado
E o país tem que fazer
Toda segurança ter
Pra não ser prejudicado.

Para evitar o aborto
Tanta gente sem apego
Só precisa de sossego
Não pode fingir de morto
Saúde, escola, emprego,
Formam o melhor arrego
E acaba este ideal torto.

A questão é complicada
De saúde e de moral
Em busca do ideal
Tem gente desesperada
Pois no âmbito legal
Também precisa de aval
Debaixo daquela espada.

Assunto tão vasto assim
Precisa de discussão
Para não ficar na mão
Ou pra não passar por ruim
Vamos ter reunião
Para saber a razão
De tanto aborto enfim.

Aborto é assassinato
De pequeno ser humano
Um gesto muito tirano
Um triste e horrendo fato
Pois o feto com os anos
Sem perigo de enganos
Pode ser Messias nato.

Uma criança, um filho,
É o que o feto é
Na barriga da mulher
Pode não ter todo brilho
Pois quando em Nazaré
Maria provou a fé
Jesus não foi empecilho.

Quem pode dispor na vida
Da vida de outro alguém?
Eu não conheço ninguém,
Pessoa tão atrevida
Que tenha tanto desdém
Para fazer algo além
Dessa missão recebida

Uma nova vida humana
Não pertence a ninguém
Nem mesmo a mãe detém
A potência tão profana
Pegar futuro nenén
Matar um Matusalém
Que dura poucas semanas

Miruel estava calado,
Ouvia a rima do Dido
Mas com um tom atrevido
Resolveu dar um recado
Que o aborto tinha sentido
Pois ele tinha ouvido
A fala de um deputado.

Dido então se concentrou
E virou-se pro seu lado
Com um tom emocionado
Rapidamente pensou
E naquele seu rimado
Sem se sentir rebaixado
Mais uma rima mandou:

- Já pensou, seu deputado,
Se a sua genitora
Fosse uma abortadora
Quando o senhor foi gerado?
O Brasil outro seria
O senhor não viveria
Tinha sido assassinado.

Mostrando conhecimento
Dido estava inspirado
E Miruel, meio acuado,
Já estava meio bufento
Já que tinha começado
Ficava todo animado
A cada novo momento.

Ninguém sabe de onde veio
A carga de informação
Talvez da televisão
Pois ele nunca fez feio
Assiste a programação
Se liga até no plantão
E nunca tem aperreio.

O jovem continuou
Sua bela prelação
Naquela situação
O aborto ele taxou
De morte sem compaixão
Pois lá na fecundação
A vida já se formou.

Aborto é infanticídio
Pois a mãe mata o filho
Que considera empecilho
Isso também deu no vídeo
Mas é também um martírio
Não digam que é delírio
Pois é tudo homicídio.

Tem quem diga que o aborto
É uma “interrupção”
Isso não é nada são
Por resultar em bebê morto
É uma intervenção
Sem qualquer contemplação
Deixa Miruel num oito.

Se trata de defender
Quem não pode protestar
Pois gerado já está
Deseja sobreviver
Mas alguém quer lhe matar
Se sua mãe abortar
Seu direito é só sofrer.

Além de ser natural
A ida tem algo mais
Deus disse “Não matarás”
Como lembra o Cardeal
O pastor não fica atrás
Diz que é o Satanaz
Que provoca tanto mal.

A ciência comprovou
Algo ainda mais triste
No feto o sistema existe
E ele sente muita dor
Mas a maldade persiste
O desumano não desiste
E anestesia indicou.

Sei que não falei de tudo
Disse Dido a Miruel,
Mas mostrei que é crurel
Você ficou meio mudo
Quem sabe se esse cordel
Não tira você do fel
E lhe faz menos sizudo?

Miruel se concentrou
Para dar sua resposta
Com a voz sempre imposta,
Mas uma lágrima rolou;
Como quem perde uma aposta
Ele admitiu que gosta
Do que Dido lhe falou.

Disse que ia refletir
Sobre coisa tão exata
Que seu amigo relata
Sem intenção de ferir
Sabe que aborto mata
E agora até se retrata
Querendo se redimir.

Dido então se despediu
Abraçando Miruel
Seu jeito de coronel
Parece que se esvaiu
Os dois olharam pro Céu
E como quem toma um mel
A dupla então se uniu.

Agora a causa da vida
Ganha um grande aliado
O homem chegou vaiado
No fim já tinha torcida
E aquela idéia sonhada
Pode ser realizada
Já está sendo aplaudida.

FIM
.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

MESTRE JESSIER QUIRINO


Arquiteto por profissão, poeta por vocação, matuto por convicção. Apareceu na folhinha no ano de 1954 na cidade de Campina Grande, Paraíba e é filho adotivo de Itabaiana também na Paraíba, onde reside desde 1983.Filho de Antonio Quirino de Melo e Maria Pompéia de Araújo Melo e irmão mais novo de Lamarck Quirino, Leonam Quirino, Quirinus Quirino e irmão mais velho Vitória Regina Quirino.Estudou em Campina Grande até o ginásio no Instituto Domingos Sávio e Colégio Pio XI. Fez o curso científico em Recife no Esuda e fez faculdade de Arquitetura na UFPB – João Pessoa, concluindo curso em 1982.

Autor dos livros: “Paisagem de Interior” (poesia), “Agruras da Lata D`água” (poesia), “O Chapéu Mau e o Lobinho Vermelho” (infantil), “Prosa Morena” ( poesia e acompanha um pires de CD ), “Política de Pé de Muro - O Comitê do Povão” ( legendas e imagens gargalhativas sobre folclore político popular ), CDs: “Paisagem de Interior 1 e Paisagem de Interior 2”, o livro: “Bandeira Nordestina” (poesia e acompanha um pires de CD), A Folha de Boldo Notícias de Cachaceiros - em parceria com Joselito Nunes – todos editados pelas Edições Bagaço do Recife - além de causos, músicas, cordéis e outros escritos.
Preenchendo uma lacuna deixada pelos grandes menestréis do pensamento popular nordestino, o poeta Jessier Quirino tem chamado a atenção do público e da crítica, principalmente pela presença de palco, por uma memória extraordinária e pelo varejo das histórias, que vão desde a poesia matuta, impregnada de humor, neologismos, sarcasmo, amor e ódio, até causos, côcos, cantorias músicas, piadas e textos de nordestinidade apurada.
Dono de um estilo próprio "domador de palavras" - até discutido em sala de aula - de uma verve apurada e de um extremo preciosismo no manejo da métrica e da rima, o poeta, ao contrário dos repentistas que se apresentam em duplas, mostra-se sozinho feito boi de arado e sabe como prender a atenção do distinto público.
Apesar de muitos considerá-lo um humorista, opta pela denominação de poeta, onde procura mostrar o bom humor e a esperteza do matuto sertanejo, sem, no entanto fugir ao lirismo poético e literário.

Depois da publicação do primeiro livro em 1996, pelas Edições Bagaço do Recife, o poeta vem defendendo sua poesia a golpes de declamações em tons solenes e brincativos, fato que já lhe rendeu fama e respeitabilidade no meio artístico e literário. Atualmente concilia sua condição de arquiteto autônomo, com uma agenda artística de vôos cada vez maiores, espalhando nordestinidade Brasil a fora.
Veja trecho da poesia "Paisagem do Interior":
"Matuto no mêi da pista
menino chorando nu
rolo de fumo e beiju
colchão de palha listrado
um par de bêbo agarrado
preto véio rezador
jumento jipe e trator
lençol voando estendido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.
Três moleque fedorento
morcegando um caminhão
chapéu de couro e gibão
bodega com surtimento
poeira no pé de vento
tabulêro de cocada
banguela dando risada
das prosa do cantador
buchuda sentindo dor
com o filho quase parido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior."(...)

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Se você me abandonar - Poesia Matuta de Carneiro Portela

Se você não me quiser
tomo licor de pimenta
bebo leite de jumenta
num lhe dou mais cafuné
desembrabeço a maré
pra ver a praia endoidar
eu faço a cobra fumar
se você fugir de mim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
bebo chumbo derretido
e nunca mais lhe convido
para ser minha mulher
num tem mais lua de mé
nem faço o sino tocar
nos lugares que eu pisar
num pode nascer capim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
arranco o rabo do peba
a galinha se amanceba
com outro bicho qualquer
não dá um adeus sequer
com vergonha do preá
e na hora de acordar
fica tocando clarim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
não é bom que se afoite
escovo a boca da noite
arranco a torre da sé
depois digo porque é
qui a muda não quer falar
o sol pára de brilhar
seu eu estiver sozim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
eu dou um susto na morte
talvez ela não suporte
se eu lhe der um cangapé
e na hora que eu estiver
danado pra namorar
digo a ela pra estourar
o meu amor com estupim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar

Se você não me quiser
quebro a tampa do pinico
mas sozim não sei se fico
feito carro sem chofer
me dane se eu não fizer
a minha égua rinchar
e depois que me olhar
eu jogo ela pro vizim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
eu ensino um burro a ler
e peço a ele pra dizer
que você ainda me quer
mas se ele me disser
que você não quer voltar
eu digo a ele pra falar
nem que seja no latim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

Se você não me quiser
eu fico brabo outra vez
e monto na gata pedrez
se outra igual não houver
se ela um chute me der
não ligo, tô com azar
mas se ela não concordar
qui eu sô bem bonitim
eu vou mudar de camim
se você me abandonar.

CARNEIRO PORTELA
"Sou um caboclo peitudo
desses da rede rasgada
eu nunca temi a nada
todo tempo topo tudo
nasci, cresci, tive estudo
sou filho de camponês
me criei pegando rês
num bom cavalo de cela
eu sou CARNEIRO PORTELA
este amigao de vocês"

Antônio Carneiro Portela (Coreaú, Ceará, 15/7/1950), formado em
Direito e Letras. Poeta, radialista (“Forrozao da Verdinha” na Rádio
Verdes Mares) e apresentador de televisão (“Nordeste Caboclo” na TV
Diário). Pesquisador da Cultura Regional.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008



Poeta nordestino retrata em forma de versos o nosso querido vale do pajeu. Ele se chama Felipe Jr., irmão do soldado Hércules da cidade de São José do Egito, um dos mais novos talentos tratando-se de poesias nordestinas, confira:


AS COISAS DO PAJEU

É uma coisa encantada
O mapa do meu sertão...
A bela Serra Talhada,
Itapetim, Solidão.
Tabira tem cantadores,
Mas atrai os compradores
De bois nelore e zebu;
Fica o sertão mais bonito,
Pois tem São José do Egito
Riqueza do pajeu.

Tem a Santa Terezinha
Que cidade hospitaleira;
Brejinho, cidadezinha;
Afogados da Ingazeira;
Tem Santa Cruz e tem Flores,
Quixaba senti odores
Da flor do mandacaru.
Iguaracy tem chão belo,
Terra de Maciel Melo
Tem que ser do Pajeu.

Tuparetama festeira,
Carnaíba da cultura.
Tem Triunfo e Ingazeira,
Calumbi, beleza pura.
Tem o forró pé-de-serra,
Tem o gosto dessa terra
Sabor de Louro e Xudu.
Se tem vates do repente
É porque toda essa gente
Vem de lá do Pajeu.

Eu deixo aqui relatado
O que eu tenho na lembrança,
Pois se torna consagrado
Nosso tempo de criança.
E você que está me ouvindo
Se pensar que estou mentindo
Vou quebrar este tabu...
Em vez de somente ler
Você tem que conhecer
As coisas do Pajeu.

Poeta Felipe Júnior